segunda-feira, 26 de março de 2012

Hunger [2008]

Agora que acaba de sair nos cinemas portugueses o segundo filme de Steve McQueen,"Shame", e que desde já prometo uma crítica assim que tiver oportunidade de visualizá-lo. Achei oportuno escrever sobre aquela que foi a longa metragem que deu a conhecer este realizador/artista plástico e que fez com que fosse premiado com a Camera D'Or (galardão que premeia a melhor estreia de um realizador) do Festival de Cannes.

Hunger é um filme muito lento e violento que relata de maneira crua as atrocidades cometidas em Long Kesh Maze Prison, local onde estavam detidos vários membros do IRA, assim como as últimas semanas da greve de fome de Bobby Sands, o líder dessa iniciativa que colocou Margaret Thatcher em "check".

Apesar de ser um filme centrado em Bobby é curiosa a maneira como abordam a apresentação da personagem principal, já que, apenas quando o filme vai longo o vemos pela primeira vez. Antes disso, conhecemos pela mão de Steve McQueen, as rotinas de um dos guardas prisionais obcecado pela sua segurança pessoal e também a chegada de um novo prisioneiro. O realizador esforça-se em não tomar qualquer partido e em colocar-se detrás de cada ponto de vista neste conflito, mas apesar dessa tentativa, não consegue disfarçar uma certa compaixão e quase simpatia pelo lado do IRA, própria de um humanista que entende que seja qual for o crime da pessoa o respeito pelo os direitos humanos é sagrado.
Steve McQueen

Apesar de se tratar de um filme político, senti que a política e a condição precária a que estão sujeitos os terroristas se trata apenas de um pretexto para o objectivo final do filme, fazer um exercício de arte. Há tantas características curiosas neste filme que quase não sei por onde começar. O primeiro ponto de interesse é a violência rude, áspera, que se manifesta tanto pela brutalidade de agressões continuas, de um assassínio tão frio que quase deixa em hipotermia a alma ou pela manifestação da fome que vai consumindo os corpos débeis dos prisioneiros.

A segunda característica que é verdadeiramente única é a cadência dos diálogos. Esta história é em grande parte desprovida de qualquer palavra, principalmente nas extremidades da sua linha cronológica. Enquanto que mais ou menos a metade do filme surge aquele que considero o coração desta obra: um diálogo ininterrupto filmado num único take de mais ou menos 20 minutos entre Bobby e o seu padre, brilhantemente escrito, no qual vemos todo o talento de Michael Fassbender e que funciona como um adeus à vida, uma extrema-unção dada entre justificações e cigarros.

A terceira característica é a a capacidade cinematográfica do realizador na qual podemos aperceber-nos do seu passado como artista plástico e da sua obsessão por produzir imagens perfeitas em cada cena. Para isso foi necessário que Michael Fassbender (Bobby Sands) emagrecesse através de uma dieta vigiada  por um médico que o levou a um estado de magreza extrema e que dá arrepios tal é o impacto da sua imagem quando combinada com a frieza das paredes dos corredores daquela prisão desprovida de sentimentos e forte em sensações cruéis.

Hunger mostra a crueldade humana em todo o seu esplendor e aquilo que o ser humano é capaz de fazer por uma ideia, por um princípio, por uma causa...

Este mais que um filme é um quadro de sofrimento.

Mais que um quadro de sofrimento, Hunger, é uma sinestesia de 96 minutos na qual a FOME se sente pelos olhos. 

Nota de entretenimento: 10 euros


Nota de imagem/fotografia: 200 euros

Nota de banda sonora: 50 euros


Nota de interesse: Se consegues aguentar ver como um homem limpa um corredor de uma prisão durante 10 minutos sem haver uma palavra (Really!!!) o resto do filme é uma agradável recompensa.

Rating Hipster: Cool para Hipsters que não pensem que o IRA é uma marca de camisas de flanela.


 Classificação do Foam: 8/10


Cinema Lusco-Fusco: Ruin

Uma curta animada realizada pela OddBall Animation sobre um mundo pós-apocalíptico.


Celorico Sabe Dançar

Falava-se de um mas serão três os festivais dedicados à dança que animarão as margens do Mondego este verão nas redondezas de Celorico da Beira. Entre o final de Julho e o inicio de Agosto o concelho não irá parar, aqui ficam as datas:



20 a 29 de Julho, MUN’DANÇAS, em Aldeia Viçosa/Guarda (20-22 Jul.) e depois em Torres do Mondego/Coimbra (23-29 Jul.) – organização da Associação de Projecto e Desenvolvimento do Parque Patrimonial do Mondego;

1 a 3 de Agosto, DANÇAS NA ÁGUA, em Ratoeira/Celorico da Beira – organização da C.M. de Celorico da Beira em parceria com a PédeXumbo;

4 e 5 de Agosto, ANDANÇAS 24H, em Ratoeira/Celorico da Beira – organização da PédeXumbo em parceria com a C.M. de Celorico da Beira.





quarta-feira, 21 de março de 2012

Indie e Tapas - A Nova Música Espanhola

Falar da música espanhola sem fazer uma referência a um dos maiores ícones de sempre do país vizinho, Camarón de la Isla, seria como negar a influência de Amália Rodrigues em muitos dos maiores compositores portugueses. Neste post não falarei da globalidade do panorama musical, mas apenas no nicho que representa o Indie-Rock espanhol. De qualquer maneira, acredito que se Camarón não tivesse existido, de uma maneira ou outra, o Rock (em Espanha), na sua generalidade teria sido muito diferente do que é hoje.
 O Gipsy-Cool, a Rockstar do Folclore, Camarón, nasceu como cigano mas morreu como uma lenda em 1992, devido a um cancro de pulmão provavelmente alimentado por muitos anos de drogas e tabagismo. Nove dos seus álbuns foram acompanhados pelo gigante Paco de Lucia e mais tarde por um dos seus alunos, Tomatito, à medida que Paco desenvolveu a sua carreira a solo. Foi um gigante do seu tempo que revolucionou primariamente o Flamenco, adicionando novos instrumentos no seu processo criativo como por exemplo o baixo eléctrico, mas as consequências da sua genialidade contaminaram todos os estilos e a essência da composição no reino vizinho.

Camaron - La leyenda del tiempo

A partir dos ritmos ciganos de Cádiz, a embriologia do Indie começou a desenhar o seu aspecto no final nos anos 70, depois da morte de Franco. O movimento que impulsionou España para a modernidade, ficou conhecido nos livros de história como "La Movida Madrileña" e foi uma autêntica revolução artística e cultural. Foi como o choro de quem nasceu e sentiu pela primeira vez o cheiro da liberdade. Todas as áreas de criação sofreram um "boom". Da música através da criação das primeiras editoras independentes e do nascimento exponencial de bandas novas, ao cinema pela mão de Pedro Almodóvar, passando pela literatura, pintura e até a moda com os desenhos pioneiros de Agatha Ruiz de la Prada, Espanha desabrochou.

À medida que os 80 passavam, micro-movimentos surgiram por diferentes cidades espanholas, San Sebastián, Barcelona, Bilbao, foram alguns dos pólos de novas tribos urbanas e modernidade social. Neste processo de expansão, inevitavelmente os ecos britânicos acabaram por ouvir-se e bandas como Joy Division e Velvet Underground transmitiram o vírus British a esta caldeirada mediterrânica que teve como resultado aqueles que foram na minha visão os pais do Indie actual: Los Planetas.
Esta é provavelmente a banda mais respeitada por todos aqueles aqueles que de alguma maneira entraram em contacto com o rock espanhol, imunes ao hype, têm receitas sólidas, e os seus pratos servidos em forma de álbuns são geralmente cozinhados na perfeição. Contam com duas mãos cheias de trabalhos na sua discografia. O perfume do Flamenco de Cádiz e as sofisticação das guitarradas das terras de Sua Majestade filtradas pelas ruas loucas de Madrid, encontraram nas muralhas de Alhambra um local para namorar e assim em Granada nasceu o Indie espanhol.

Los Planetas - Un buen dia

A partir daqui e como diz o povo: "Foi sempre a abrir"!
Nos oito anos que vivi em Espanha aprendi que os nossos vizinhos gostam de exagerar em muitas coisas. E no que toca à cultura Indie está completamente massificada. O alternativo é que agora vás nas ruas de Barcelona sem umas Ray-Ban postas. Por esta razão é impossível falar das muitas dezenas, senão centenas de bandas que procuram um espaço no mercado musical e na rota dos festivais de verão espanhóis. Farei apenas um resumo de bandas que podem ser agradáveis aos leitores. Sinceramente creio que não existe nenhuma que me encha as medidas, mas o objectivo deste post é dar a conhecer um novo universo musical, a quem não conhece.

Um dos meus favoritos são os Catpeople, conjunto galego que reside em Barcelona. Contam já com três álbuns e têm desenvolvido de forma sólida uma carreira que parece durar ainda que cantem em Inglês, condição que apesar de notórias melhorias limita em muito a popularidade de uma banda em Espanha. A generalidade dos espanhóis é péssima em Inglês e tudo o que não sejam refrões orelhudos e na-na-nas é muito difícil que pegue. Estes conseguiram!

Catpeople - Radio

Catpeople - Love Battle

Por falar em refrões fáceis em inglês, ficam aqui também os já extintos mas simpáticos The Sunday Drivers que fizeram bastante sucesso e correram todo o país durante 10 anos até 2010.

The Sunday Drivers - Do it

Os Zodiacs tentaram compor a Reptilia dos Strokes à moda ibérica e embora tenha sido um grande sucesso, o seu estado como banda continua bastante letárgico.

Zodiacs - Chica Normal

Mas nem tudo é rockzinho garage para ouvir na rádio a meio gás. Existem também coisas totalmente novas. Um dos melhores exemplos é o Indie-Tropical que Pablo Diaz-Reixa, através do seu projecto El Guincho, faz. Um exemplo de originalidade e internacionalização."Bombay", um dos singles do seu último álbum "Pop Negro" já teve direito ao seu YEAHHH FOAMCLIP, mas está aqui de novo.

El Guincho - Bombay

Pelos antros escuros do electro-punk e o electroclash deambulam grupos que envergonhariam a própria pauta musical fazendo com que as suas linhas servissem para enforcar a clave de Sol. Os Putilatex são tão maus que nem tenho coragem de os pôr aqui no Foam, porém um imenso sucesso. Já um bom exemplo do que é uma boa malha de batidas e sintetizadores são os Cycle, este é o single que os resgatou do anonimato e gerou uma grande confusão.

Cycle - Confusion!!!

Folk!? Sim, também há! Russian Red, por muitos chamada a "Feist espanhola" marca já presença nos grandes festivais europeus ao lado dos nomes mais sonantes da música internacional. A compositora Lourdes Hernández tem 26 anos e anda nestas andanças desde 2007. "Fuerteventura" o último dos seus dois álbuns, foi acolhido com grande sucesso principalmente pelo público feminino.

 
Russian Red - Fuerteventura

Vetusta Morla (Madrid) e Love of Lesbian (Barcelona) são provavelmente as duas bandas que a nível nacional mais sucesso têm conseguido no presente. Cantam em Castelhano e são conhecidos pela maioria dos jovens cosmopolitas. Os seus concertos enchem em qualquer cidade e apesar de ambos andarem em palco há mais ou menos 15 anos, são a face mais recente desta cultura que parece transformar-se com o tempo mas que parece não ter fim. 

 
Vetusta Morla - Lo que te hace grande

Love of Lesbian - Alli donde soliamos gritar

Espanha ultrapassa em grandeza cultural o seu próprio nome, o castelhano não é a única forma de expressão musical e os Manel o melhor exemplo disso, tendo conseguido o incrível feito de colocar em primeiro lugar no top de vendas, por primeira vez na história, um trabalho cantado em catalão. 

Manel - Benvolgut

Para terminar este mega-post que deu muito trabalho e que espero que vos tenha gostado e mostrado um universo algo desconhecido deixo mais uma sugestão que brevemente marcará presença por terceira vez em Portugal. Depois do Festival Serra da Estrela e de Paredes de Coura os The Right Ons visitam o Porto no contexto do Optimus Primavera Sound prometendo pôr tudo a mexer com o seu shoegaze contagiante

The Right Ons - Do your thing, babe


The Right Ons - On the Radio

Sei que muitos portugueses ainda pensam que Espanha se resume a Bisbal e Héroes del Silencio e mantenho a esperança que com este post possa ter contrariado essa teoria. Nem todas as bandas que postei são do meu agrado, nem todas me parecem qualitativamente boas, mas é o que se ouve naquelas paragens. Devem considerar isto um Guia de Sobrevivência se algum dia considerarem uma visita aos escuros caminhos da teia dos clubes alternativos de Barcelona ou Madrid (lol).

O Indie já está servido, fico à espera das Tapas. Alguém???


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